domingo, 17 de junho de 2012

A boa a má tristeza



"A tristeza que é segundo Deus, afirma São Paulo, produz uma penitência estável para a salvação; a tristeza do mundo produz a morte (2 Cor. 7, 10). A tristeza pode, pois ser boa ou má, conforme os efeitos que produza em nós. Mas, em geral, produz mais efeitos maus que bons, porque os bons são apenas dois: a misericórdia - o pesar pelo mal dos outros -  e a penitência - a dor de ter ofendido a Deus -, ao passo que os maus são seis: medo, preguiça, indignação, ciúme, inveja e impaciência. Por isso, diz o Sábio: A tristeza mata a muitos e não há utilidade nela (Ecle. 30, 25), já que, para dois regatos de águas límpidas que nascem do manancial da tristeza, nascem seis de águas poluídas"[1].
Essa é a razão por que o demônio faz grandes esforços para produzir em nós essa má tristeza, e, a fim de levar-nos a desanima, começa por perturbar-nos. Não lhe custa muito sugerir pretextos para isso. Não deveríamos afligir-nos por ter ofendido a Majestade divina, ultrajado a Beleza infinita e ferido o coração de Deus, o mais terno dos pais?
"Com certeza", responde-nos São Francisco de Sales. "Devemos entristecer-nos, mas com um arrependimento verdadeiro, não com uma dor mal-humorada, cheia de despeito e indignação. O verdadeiro arrependimento é sempre calmo, como todo o sentimento inspirado pelo bom Espírito: o Senhor não está na perturbação (3 Re. 19, 11). Onde principiam a inquietação e a perturbação, a tristeza má passa a ocupar o lugar da tristeza boa.
"A má tristeza" - insiste o Santo - "deprime e perturba a alma, inquieta-a, incute-lhe temores desmedidos, tira-lhe o gosto pela oração, atordoa e fatiga-lhe a cabeça, impede-a de tirar proveito dos bons conselhos, de tomar resoluções, de formar juízos, de ter coragem, e abate-lhe as forças. Numa palavra: é como um inverno rigoroso que cresta toda a formosura da terra e mergulha na letargia todos os animais; porque priva a alma de toda a suavidade e a deixa paralítica, bloqueando todas as suas faculdades"[2].
Muitos de nós reconhecerão nestes sintomas a perturbação em que se deixaram envolver após as suas faltas e os estragos que ela lhes causou! Tinham começado a levar a sério a vida espiritual e seguiam resolutamente os passos do Mestre pelo caminho do dever, pela rude encosta do Calvário. Mas eis que sobrevém um queda e, com ela, a perturbação! A alma levanta-se sob o amparo do arrependimento e da absolvição sacramental, que tudo bem reparar. Mas nem por isso sossega. Olha-se, examina-se ansiosamente, conta as feridas mal cicatrizadas, remexe-as com receio, infecta-as mais por querer curá-las com despeito e impaciência, "porque não há nada que mais conserve os nossos defeitos do que o desassossego e a pressa em querer expurgá-los"[3].
Entretanto, o passo vai afrouxando. Já não se corre; anda-se a custo. A pessoa arrasta-se, descontente de si e quase que do próprio Deus, perde a confiança na oração e abeira-se dos sacramentos com medo - até que uma circunstância especial, uma confissão excepcionalmente bem feita ou um retiro, lhe restitui por um certo período o fervor que tivera no princípio. Mas se, decorrido algum tempo após essa renovação, não elimina essa intranquilidade, uma nova queda ou simplesmente a lembrança das faltas passadas provocará nela um surto de redobrada depressão e melancolia; voltará ao passo cansado e queira Deus que, à força de hesitações e delongas, não termine por cair numa inércia quase sem remédio.
 
[1] Introdução à vida devota, São Francisco de Sales, IV, 12.
[2] Idem;
[3] Obras Completas de São Francisco de Sales, Annecy, 1832-1932, XIV, 120.
Fonte: "A arte de aproveitar as próprias faltas" - Joseph Tissot; Terceira edição, Quadrante - São Paulo 2003.

segunda-feira, 4 de junho de 2012


FESTA DO SANTÍSSIMO SACRAMENTO

Pe. David Francisquini



A Igreja Católica, nesse 07 de Junho, comemora uma das mais belas solenidades do seu calendário litúrgico em honra da presença real de Jesus Cristo na santa Hóstia Consagrada. A Hóstia Santa nos envolve, nesse dia, numa atmosfera celestialmente cristã de piedade, devoção e entusiasmo, pois Jesus está realmente presente no Sacramento do Divino Amor, tantas vezes ressaltado por Nosso Senhor em Seus ensinamentos. Prova disso são as próprias palavras do Salvador: “Isto é meu Corpo que por vós será entregue”; “este é meu Sangue que será derramado por muitos”, (Lc. XXII, 19-20). E ainda: “Eu sou o Pão vivo, que desci do céu. Se alguém comer deste Pão, viverá eternamente. O Pão que Eu darei é a minha Carne para a vida do mundo”, (Jo. VI, 51-52).  Debaixo das espécies do pão e do vinho está o Corpo vivo e o Sangue vivo de Cristo e por conseguinte, Jesus vivo, como, por analogia, dentro da “menina” dos olhos se retrata uma paisagem inteira. Por esta razão afirma São Luís, rei de França: “Se Cristo operasse um milagre ao fazer-se a Transubstanciação (do pão e do vinho), de modo que pudéssemos ver com os olhos o Seu sagrado Corpo, eu fechava os meus olhos para não perder o merecimento da fé”. Santo Alberto Magno faz as seguintes considerações: “O calor natural do corpo humano muda o pão e o vinho em carne e sangue; a vinha transforma em vinho a água da chuva; as abelhas, o suco das flores em mel; logo, Jesus Cristo, com mais razão, pode, pelo poder da Sua Palavra, mudar o pão na substância do Seu Corpo, o vinho na substância do Seu Sangue”.  “Aquele que tudo tirou do nada, pode também mudar o que já existe” (Santo Ambrósio).
Assim, a virtude da fé convida todos os fiéis a trilharem  e seguirem constantemente os caminhos sublimes das harmonias e belezas da única Igreja verdadeira, a qual nos ensina a presença real de Jesus na Hóstia consagrada no Sacrifício da Missa, que é, por sua vez, levada em Procissão dentro do Sagrado Ostensório, pelas principais ruas das cidades, onde se desenrolam as várias bênçãos.    
Aplica-se e comprova-se de maneira sensível e admirável as palavras da Escritura, no Antigo Testamento, que dizia que nenhum povo tinha um Deus tão junto de si quanto o povo hebreu. E, Jesus, nosso divino Mestre, nos ensina dizendo: “E eis que estarei convosco todos os dias até a consumação dos séculos”, (Mat. XXVIII, 20). Em conseqüência da piedade eucarística do século XI, a festa de Corpus Christi foi introduzida na Igreja Universal pelo papa Urbano IV, aos 11 de agosto de 1264. O Ofício foi composto por Santo Tomás de Aquino, que,  por amor à tradição litúrgica, conservou algo já existente em algumas Igrejas. A Procissão surgiu em Colônia, Alemanha, espalhando-se logo por alguns países e difundindo-se por toda a Igreja pela ação do referido papa, tendo papel preponderante, Santo Tomás de Aquino. 
O amor do povo católico sempre soube encontrar o que tem de melhor em matéria de esplendor e beleza para reverenciar publicamente Nosso Senhor. Há grande criatividade na confecção dos lindos tapetes nas ruas, de sal grosso, flores, tecidos e outros materiais, que com desenhos variegados e enriquecidos pela multiplicidade das cores nos dão um aspecto fascinante e grandioso do mistério de Jesus na Hóstia Consagrada.